Contratos de Investimento e Empréstimo

É muito comum no estágio inicial de um empreendimento, que o empreendedor conte com auxílio externo, seja por meio de capital ou maquinário.
Porém, para fazer isso com segurança, é necessário tomar alguns cuidados jurídicos na redação de contratos de investimento e de empréstimo, tópicos que serão abordados no presente artigo.
O papel desses contratos
A relação de empréstimo é centrada na concessão de algum bem. A fim de regularizar essa relação se estabelecem contratos de empréstimo, em que a parte detentora de recursos empresta seus bens àqueles que necessitam recebê-los.
Esse fornecimento de recursos, pode ser realizado com a expectativa de se obter recompensas, configurando um investimento. Ou seja, os contratos de investimento podem atuar como contratos de empréstimo.
Em alguns tipos de investimentos pode ocorrer a intervenção de uma plataforma de investimentos utilizada para viabilizar a relação entre investidores e empresas que ofertam investimentos.
Assim, o termo contratual estabelece as relações basilares entre as partes, alinhando suas expectativas diante de um investimento ou empréstimo, o que pretendem arriscar, assim como o que pretendem obter ao assumir esse risco.
Os tipos de contrato de empréstimo
1. Contrato Comodato
O contrato de empréstimo comodato [1] trata da concessão de bens insubstituíveis (infungíveis), devendo ser devolvido o mesmo bem que foi emprestado.
O comodato é um contrato em que somente aquele que adquire o empréstimo, é beneficiado, enquanto aquele que empresta o bem, atua com confiança e boa-fé naquele que irá usufruir de seu bem.
Por isso, entende-se que esse tipo contratual não configura um investimento.
2. Contrato Mútuo
Já o empréstimo, mútuo [2], refere-se a um bem consumível (fungível), devendo ser devolvido na mesma quantidade e qualidade do emprestado.
No mesmo sentido, este empréstimo se ramifica em 2 vertentes, são elas: o mútuo feneratício (oneroso) e o mútuo conversível.
O feneratício trata da relação de empréstimo de dinheiro com incidência de juros.
Nesse caso, são estabelecidas condições contratuais para que haja acordo sobre o empréstimo e a restituição desse bem, acordados os juros e compensações necessárias.
Em relação aos contratos de mútuo conversível, o empréstimo deve ser devolvido na forma de cotas de participação. Essas cotas são frações do capital social da empresa.
O contrato de mútuo conversível tem sido o mais utilizado em ações de investimento no Brasil, especialmente de investimento coletivo em startups.
Isso porque no caso de um investimento bem-sucedido, o valor da cota de participação pode ser muito maior que o valor inicial, mesmo considerando os juros.
Elementos dos contratos
Todo contrato tem elementos essenciais como a qualificação das partes, seus direitos e obrigações, estabelecimento de prazos, etc.
Tendo em vista que investimentos são manobras arriscadas para todas as partes, torna-se essencial que no momento do estabelecimento da relação contratual, sejam definidas condições para que esses riscos sejam assumidos.
É necessária a presença de uma cláusula que declare expressamente ou um Termo de Ciência de Risco anexo ao contrato, uma vez que o investimento pode não dar retorno..
A qualificação das partes também é de extrema relevância, podendo ser determinantes para o tipo de contrato a ser estabelecido e outras cláusulas subsequentes. Por exemplo, em contratos que conferem títulos conversíveis em participação o tipo societário da emissora da oferta de investimento será uma informação decisiva para o estabelecimento da maneira que se dará essa conversão.
Além disso, as partes devem manter-se atentas a seus direitos e obrigações, a fim de evitar abusos. Em contratos de crowdfunding mediados por plataformas de investimento é dever da plataforma garantir direitos essenciais aos investidores, previstos em regulamentação da CVM.
Outros elementos contratuais se apresentam além desses e devem sempre estar de acordo com as necessidades das partes, assim como suas motivações e expectativas quanto ao contrato a ser firmado
Plataformas de Investimento e Investimento Participativo
As plataformas de investimento atuam para viabilizar as ofertas, emitidas principalmente por startups, em regime de crowdfunding.
O crowdfunding é a captação de recursos de uma empresa por meio da agregação de múltiplas fontes de financiamento.
Essa modalidade de investimento tem se desenvolvido bastante, principalmente quando passou a ser regulamentada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), cujo papel é disciplinar e fiscalizar o mercado de valores mobiliários.
Muitas vezes é o papel dessas plataformas, providenciar um modelo ou uma base para esses contratos, e adaptá-los à cada situação para que sejam suficientes para consolidação do investimento.
O crowdfunding ou investimento participativo utiliza dos contratos de mútuo conversível, já que esse, pelo exposto, se coloca como uma opção interessante aos investidores.
Diante das nuances e riscos inerentes aos investimentos e aos empréstimos, é extremamente necessário o auxílio de uma assessoria jurídica de qualidade para análise e formulação desses contratos.
Autora:
Helena Veras Menezes Cavalcante
Notas de rodapé:
[1] Regulado pelos artigos 579 ao 585 do Código Civil.
[2] Regulado pelos artigos 586 ao 592 do Código Civil.
Referências Bibliográficas:
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